Afonso Poyart, Presságios de Um Crime
Sempre há expectativa quando um talento nacional é convocado para tocar uma produção estrangeira. Com “Presságios de Um Crime”, Afonso Poyart integra um grupo seleto de cineastas brasileiros que receberam a oportunidade de trabalhar na indústria americana com um elenco cheio de astros, a exemplo de Fernando Meirelles (“O Jardineiro Fiel”), Walter Salles (“Água Negra”) e José Padilha (“Robocop”).
Sendo exibido a partir de hoje em nosso circuito, “Presságios de Um Crime” permitiu a Poyart trabalhar com mais liberdades do que, por exemplo, Heitor Dhalia, que debutou em Hollywood com o thriller “12 Horas“. Em entrevista por telefone, o diretor conta sobre a experiência ao liderar um grande projeto após “2 Coelhos“, a qual classifica como extremamente satisfatória, mesmo com alguns reveses inevitáveis. Para ler a nossa opinião sobre a produção estrelada por Anthony Hopkins, Abbie Cornish, Jeffrey Dean Morgan, Colin Farrell e Marley Shelton, basta clicar aqui.
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Originalmente, “Presságios de Um Crime” foi planejado como uma sequência para “Seven”. Quando o roteiro de Ted Griffin e Sean Bailey foi apresentado a você, havia algum resquício da produção de 1995?
Essa ideia existiu, mas há muito tempo. Nunca foi escrito um tratamento relacionado a “Seven”, pois a ideia nunca foi para frente. Os primeiros tratamentos do Sean Bailey já estavam em um universo diferente. “Presságios de Um Crime” virou outra coisa, mesmo.
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Identifica na “missão” de Charles Ambrose paralelos com as ações do John Doe de Kevin Spacey?
Pode ter, mas nada consciente, de ter de seguir isso. Charles é um vilão que também acredita muito em sua agenda, mas é bem diferente de John Doe.
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Como produtor executivo, Anthony Hopkins exerceu forte influência para a sua contratação em “Presságios de Um Crime”. Como ator, é conhecido pelo temperamento, a resistência a ensaios. Como avalia a experiência e as pressões em dirigir um dos veteranos mais respeitado do cinema?
Foi muito legal. Claro, tivemos os nossos atritos para entender mais sobre o projeto. Eu vim de um filme muito pequeno e, de repente, me vi em um filme desse porte com Anthony Hopkins. Então era natural que ele estivesse com o pé um pouquinho atrás. Acho que a confiança foi se criando devagar entre ele e eu, mas ele é muito legal. É um cara que tem os seus momentos, mas longe de ser uma estrela ao ponto de solicitar luxos, de ter complexos ou  de nos desrespeitar. As discussões sempre foram em prol do trabalho, é um cara que exige muito, que, assim como ele, quer que tenhamos um ponto de vista forte sobre o que pensa sobre os personagens. Claro, não foi fácil trabalhar com ele, mas o importante é que acabou tudo bem. Ele gostou muito do filme. Ligou-me e falou que adorou. E ele está muito bem.
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Ao contrário de Heitor Dhalia, você avalia ter debutado em Hollywood com condições menos restritivas. Sente ter inserido a sua própria assinatura em “Presságios de Um Crime”?
A hora da pré-produção é a mais importante. Houve um produtor nesta etapa que estava lá, todo abilolado. Acho que algumas decisões eu não tive tanta liberdade artística, mas nada de realmente parecido com o Heitor Dhalia falou por aí, no que ele foi bem taxativo no que se refere a não ter qualquer tipo de liberdade. Eu tive. Não total, do jeito que eu gostaria ou que eu tive nos meus filmes aqui no Brasil. A Isabela Boscov fez agora uma crítica do filme na Revista Veja na qual foi bem precisa. Ela disse que consegue ver um filme que quer ser, mas está meio abafado por algumas coisas. Então eu sinto um pouco disso, um problema em lidar com os caras, mas nada demais. Até digo que o problema é na falta de um produtor forte, pois os produtores fracos fazem mais bagunça que a vida. Foi isso que aconteceu no meu caso. Ficou um cara bem fraquinho, que mais atrapalhava do que ajudava.
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Você conseguiu trazer a bordo inclusive o seu montador Lucas Gonzaga, conferindo ao thriller a agilidade que testemunhamos em “2 Coelhos”. Como avalia a nova parceria em uma produção estrangeira?
Tentaram me mostrar alguns editores e logo de cara disse que queria trabalhar com o Gonzaga. Há duas funções que sempre falo que é difícil trabalhar com outras pessoas, sendo o fotógrafo e o montador. Isso é uma questão particular e que já desenvolvi com algumas pessoas que conhecem o meu estilo, sabem do que eu gosto, o que faz a gente trabalhar com mais rapidez. Eu gosto de narrativa que não para, me incomoda quando há lentidão. Normalmente, o Lucas gosta de editar assim quando tem a oportunidade. Gosto de filmes com muito conteúdo. Para contar a sua história em determinado tempo, é preciso que ele ande rápido. O montador e o fotógrafo são duas coisas muito importante para mim que não abro muita mão. Até estava com o meu fotógrafo, o Carlos André Zalasik. Ele foi selecionado como fotógrafo do filme e quando chegou lá, pediram para sair dessa função e ser um dos câmeras por conta de seu inglês não estar funcionando muito bem, sendo uma das coisas que perdi. Foi uma diferença muito grande não ter um fotógrafo ao meu lado, porque entrou um cara que eu não me dei muito bem. Eu não o conhecia, então fiz uma escolha errada e paguei o preço por isso, assim como o filme. São duas funções que acredito que não dá para brincar de trocar, sabe?
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Além de Hopkins, Abbie Cornish se destaca no elenco como a agente Katherine Cowles. A australiana acabara de sair de “RoboCop”, sob a direção de José Padilha. Quais as principais memórias quanto a parceria com Abbie? A atriz em algum momento partilhou sobre as possíveis distinções ao ser dirigida por brasileiros?
Ela é muito legal, foi uma das pessoas com quem mais tive uma relação pessoal. Conversei com o Padilha e ele falou muito bem dela, o que me fez escolhê-la. As pessoas não prestam tanta atenção em relação a nacionalidade. Lá há pessoas de tudo quanto é lado, principalmente diretores, um cargo que não depende tanto da língua. Ao contrário do ator, que você conta nos dedos quantos estão em filmes estrangeiros. Nós temos o Rodrigo Santoro, a Alice Braga… São poucos que conseguiram essa transposição, pois ela é difícil. Para os diretores é mais fácil, não temos que aparecer em frente às câmeras.
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Há alguma novidade quanto ao lançamento nos cinemas americanos? Após o empecilho com a Relativity Media, outra empresa pode assumir a distribuição do filme?
O filme prossegue com a Relativity Media. Digo pelas informações que chegam a mim, pois não participo da parte comercial do filme. A distribuidora teve um problema, como todos sabem, e já tínhamos vendido os direitos para ela. Prossegue no acervo. Ela passou por uma reestruturação e “Presságios de Um Crime” faz parte dela. Acho muito difícil o filme sair deles, pois eles conseguiram essa reestruturação usando o próprio catálogo. Devem lançar para frente, todos os credores usaram o portfólio com “Presságios de Um Crime” nele. Mas é um problema, será o último território que o exibirá.
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Qual o status de “Mais Forte que o Mundo – A História de José Aldo”, o seu terceiro longa-metragem? Há planos para lançá-lo ainda neste ano?
O filme já está em fase de finalização, inclusive em relação ao áudio e aos efeitos visuais. Ele deve ser lançado até o meio deste ano. Ele é bem diferente, tem uma pegada pop e há uma mensagem forte. Eu estou bem orgulhoso dele. É um romance, uma drama familiar e tem ação.