Alguns compromissos e estudos nos fizeram preterir os lançamentos por alguns clássicos e filmografias em particular no curso de 2015. Portanto, somente nas últimas semanas do ano nos preparamos para uma repescagem, com tudo aquilo de essencial que perdemos durante a passagem no circuito comercial ou mesmo em homevideo.
O empenho em correr atrás desses filmes que devem ser vistos antes de fechar uma lista de melhores nos tranquilizou, no sentido de que a nossa relação de piores está inalterada desde agosto. Portanto, a meta de ser mais seletivo surtiu um efeito positivo, com potenciais bombas sendo evitadas.
Ainda assim, elas existem e podem se revelar até mesmo em filmes que aguardamos com alguma expectativa ou no desafio da cobertura jornalística em um lançamento. Grande parte dos títulos a seguir se encaixa nessas condições e, por isso mesmo, buscamos (des)privilegiar o que houve de pior no cinema em 2015, seja no circuito alternativo, seja em títulos que predominam as salas de shoppings.
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#01. Adeus à Linguagem, de Jean-Luc Godard +
Como um experimento, “Adeus à Linguagem” pode se comportar como um estudo curioso (e nada mais do que isso) sobre a predominância do digital e o quanto as transições do cinema fazem muitos diretores reavaliarem as novas possibilidades para contar uma história. Como cinema, “Adeus à Lingaugem” é um registro triste sobre Jean-Luc Godard desaprendendo o seu ofício, acreditando que vomitar citações de Darwin, Faulkner e Sartre e de distorcer as músicas de Bethoveen e Tchaikovsky são recursos para engrandecer personagens que carecem de uma alma. Uma agressão aos sentidos.
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#02. Loucas Pra Casar, de Roberto Santucci
Existe extremismo quando se fala das comédias com o selo Globo Filmes, como se todas fossem abomináveis ou meras transposições para o cinema de projetos televisivos. A verdade é que títulos como “Até que a Sorte nos Separe” e “Minha Mãe é Uma Peça – O Filme” fazem sucesso devido às premissas com temas que conseguem cativar, como a dificuldade de administração de fortunas daqueles que enriquecem da noite para o dia ou os exageros do zelo maternal. Não é o que acontece em “Loucas Pra Casar”, uma comédia que só nos perturba com o embate entre três mulheres histéricas para conquistar o mesmo homem. A surpresa final, que chegou a ser comparado com “O Sexto Sentido” por Ingrid Guimarães, só embaraça o que já estava irreversivelmente constrangedor. Além do mais, é impossível não namorar com a tecla “ejetar” quando “Happy”, de Pharrell Williams, é tocada pela enésima vez.
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#03. O Amuleto, de Jeferson De
Filmes estrangeiros de terror fazem um sucesso imenso no Brasil. Ainda assim, a nossa produção pena para produzir os seus próprios representantes do gênero. As coisas estão mudando um pouco, mas ainda há muito a ser feito. A existência de “O Amuleto” é um exemplo. Sem nenhuma experiência prévia que comprove o seu tino para o gênero, Jeferson De (“Bróder”) subverte as “regras” ao antecipar para o primeiro ato os danos de seu mistério somente para rechear as consequências dessa escolha com chavões surrados. Além de adolescentes aborrecidos, os personagens centrais de “O Amuleto” são daqueles que não conseguem demonstrar qualquer amadurecimento nos diálogos que entonam e ainda têm uma facilidade risível de se perderem em meio a floresta a partir de ações como tirar a água do joelho. Para cada Marco Dutra ou Rodrigo Aragão, haverá sempre um “O Amuleto” para retardar o nosso progresso.
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#04. Cinquenta Tons de Cinza, de Sam Taylor-Johnson
Existia alguma esperança de que a adaptação do best seller “Cinquenta Tons de Cinza” fosse capaz de superar a caretice que impera em Hollywood com o seu inevitável sucesso comercial. Ledo engano. As peripécias sexuais da então virginal Anastasia Steele (Dakota Johnson) e o seu amado milionário Christian Grey (Jamie Dornan) provam que o cinema americano regrediu aproximadamente 30 anos. A ousadia de cineastas como Adrian Lyne e Paul Verhoeven é um passado lamentavelmente castrado, dando lugar a cenas de sexo pudicas que não dialogam com o perfil aparentemente perturbador de seu protagonista. A equipe com pedigree, como o diretor de fotografia Seamus McGarvey (“Desejo e Reparação”), o compositor Danny Elfman (“Peixe Grande e Suas Histórias Maravilhosas”) e até mesmo a colaboração da montadora Anne V. Coates (“Lawrence da Arábia”), são meros adereços para a escritora E.L. James, que detém o controle artístico da adaptação de seu romance homônimo, um patético conto de fadas às avessas.
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#05. Qualquer Gato Vira Lata 2, de Roberto Santucci +
Novamente, Roberto Santucci tem um de seus filmes citados nesta lista de piores, desta vez dividindo a desonraria com Marcelo Antunez para que “Qualquer Gato Vira Lata 2” pudesse ser confeccionado mais rápido. É uma curiosidade importante, pois cada vez Santucci se assemelha mais a um empresário e menos como um diretor, tendo despontado como uma promessa após o regular “Bellini e a Esfinge”. Na verdade, o que mais incomoda nesta sequência protagonizada por Cléo Pires, Malvino Salvador e Dudu Azevedo é a total cara de pau em surrupiar a premissa de comédias americanas de sucesso, como “Esposa de Mentirinha”. E preparem-se, pois logo mais “Um Suburbano Sortudo” pintará nas telonas.
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#06. Deixa Rolar, de Justin Reardon
Mais que um mero galã. Chris Evans conseguiu a cobiçada posição de astro hollywoodiano, graças ao sucesso de “Capitão América” e um contrato confortável com a Marvel. Porém, fora desse universo de super-heróis, anda tendo dificuldades para ser levado a sério – excetuando, claro, o formidável “Expresso do Amanhã”. “Deixa Rolar” marca os seus primeiros passos como produtor após uma experiência inexpressiva na direção de “Before We Go”. Evans é também o protagonista, um boa-pinta desinteressado em relacionamentos sérios. Bom, isso até aparecer Michelle Monaghan, aquela graça de mulher que vai desencadear tudo o que estamos exaustos de ver em comédias românticas vulgares e esquemáticas: as indecisões quanto ao homem que ela deve escolher, alguns dramas inócuos que buscam justificar a cafajestice do protagonista, a corrida para impedir um casamento, o discurso constrangedor ao final… Somente a presença engraçadinha de Topher Grace torna o humor mais tolerável.
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#07. O Rio nos Pertence, de Ricardo Pretti +
Parte de uma trilogia denominada como Operação Sônia Silk, “O Rio nos Pertence” é inspirado em um projeto da produtora Belair, no qual Júlio Bressane e Rogério Sganzerla se desdobraram durante três meses para conceber sete filmes. Assim como no passado, o resultado não passa de um exercício pretensioso, com “O Rio nos Pertence” certamente representando a ponta mais frágil do triângulo. Mesmo que seja curioso observar a instável protagonista de Leandra Leal em um cenário carioca despovoado e nada tropical, o que se tem é aquele velho caso de um artista presunçoso com o desejo de compartilhar histórias com relevância apenas para si mesmo.
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#08. Amaldiçoado, de Alexandre Aja
Americano de 43 anos, Joe Hill continua avançando para ser um sucessor à altura de seu pai, Stephen King. Os sucessos de “A Estrada da Noite”, “Nosferatu” e “O Pacto” provam que Hill está andando no caminho certo. Em contrapartida, a adaptação de “O Pacto”, batizada como “Amaldiçoado” em seu lançamento no Brasil direto em homevideo, prova que precisará tomar mais cuidado ao vender os direitos de seus romances. Isso porque o francês Alexandre Aja, que não faz nada digno desde “Viagem Maldita”, parece não saber o que fazer com o material. Na mistura de fantasia, terror e comédia, “Amaldiçoado” se arrasta durante duas horas que penam para chegar ao fim, trazendo ainda uma direção atroz de atores – Max Minghella está especialmente terrível no papel do melhor amigo do protagonista vivido por Daniel Radcliffe.
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#09. Rua Secreta, de Vivian Qu +
Exibido na 38ª Mostra Internacional de Cinema em São Paulo, o chinês “Rua Secreta” certamente ocupou a oportunidade de lançamento em circuito comercial de algum dos inúmeros títulos superiores que infelizmente se perdem após a passagem por festivais. Isso porque essedebut de Vivian Qu na direção e roteiro acompanha com desinteresse um jovem que se vê enroscado em uma teia conspiratória ao se sentir atraído por uma jovem que atua em uma empresa misteriosa. Embora a premissa seja uma grande promessa para um thriller, com o protagonista não identificando em seus equipamentos de mapas digitais alguns locais em que seu interesse amoroso transita, Qu contenta-se com uma condução em banho-maria e uma conclusão em aberto propenso a gerar mais frustrações do que questões para o seu enigma.
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#10. Vício Inerente, de Paul Thomas Anderson
Paul Thomas Anderson não é um cineasta dos mais ativos, chegando a atingir cinco anos de intervalo entre a realização entre um filme e outro. Dois anos após “O Mestre”, o americano vem com “Vício Inerente” esquecendo-se de uma máxima sobre a obra do excêntrico Thomas Pynchon: inadaptável. PTA não entendeu o recado, camuflando com a boa reconstituição de uma época o ritmo claudicante de uma história não compatível com a narrativa cinematográfica. Além do mais, o extremo formalismo de sua condução não tem ressonância com a decadência que contamina toda a história, muito distante da estética pornográfica de “Boogie Nights: Prazer Sem Limites”.
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