Desde allá, de Lorenzo Vigas
.:: 39ª Mostra Internacional de Cinema em São Paulo ::.
Presidido por Alfonso Cuarón, o júri deste ano do Festival de Veneza laureou “Desde Allá” com o Leão de Ouro, prêmio máximo do evento italiano. É a primeira vez que uma produção latino-americana obtém o feito e imediatamente a honraria foi associada pela imprensa a um ato de favorecimento a uma obra vinda do mesmo continente de seu presidente.
As suspeitas são intensificadas com o fato de Lorenzo Vigas ser um realizador de primeira viagem, tendo os veteranos Marco Bellocchio (“Sangue do Meu Sangue”), Atom Egoyan (“Memórias Secretas”), Amos Gitai (“Rabin, the Last Day”) e Jerzy Skolimowski (“11 Minutos”) como alguns dos competidores. De qualquer modo, é natural festivais como o de Veneza, com todas as ambições de promover atos políticos por meio da arte cinematográfica, serem alvos desse tipo de recepção e, verdade seja dita, “Desde Allá” é um filme digno de louros pelo que é até os seus cinco minutos finais.
O extraordinário Alfredo Castro prova mais uma vez ser um dos grandes atores em atividade na pele de Armando, um senhor aparentemente polido que tem como prazer secreto pagar rapazes desfavorecidos para se despirem diante de si em seu apartamento. Funcionário em uma mecânica e marginal com o desejo de comprar um carro, Elder (Luis Silva) é abordado por Armando, mas quebra o padrão de passividade dos rapazes ao agredi-lo.
Esses personagens voltarão a se reencontrar e Lorenzo Vigas, em um roteiro que teve o seu argumento também assinado por Guillermo Arriaga, constrói com muito cuidado o relacionamento que ambos vão construindo com inúmeras resistências. Em comum, Armando e Elder são filhos de homens que o negligenciaram no processo de formação da própria identidade. Armando não verbaliza essa ausência de afeto, mas ela é clara. O oposto faz Elder, que chega a assumir que, caso se tornasse um pai, bateria em seus filhos para eles aprenderem que a vida não é justa.
Armando e Elder são personagens surpreendentes e críveis, reflexos de uma sociedade com a instituição familiar em declínio e vividos por atores soberbos – com Luis Silva com uma pequena vantagem diante de seu co-protagonista por ser um iniciante que compreende muito bem os dramas de seu personagem. É uma pena que a química entre figuras tão dispares corrobore para um fim amargamente preguiçosa ao propor questões desinteressantes ao público e que nada soma ao papel de cúmplices que assumimos com tanta entrega antes de sua resolução em aberto.
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