Por Filipe Pereira
Analisando a fugacidade humana por um olhar que mistura contemplação com intimismo narrativo, Jean Luc Godard apresenta uma análise sobre uma viagem marítima, que corta o Mar Mediterrâneo em um cruzeiro, no primeiro ato do filme. O roteiro emula as características de uma sinfonia de três movimentos, sendo o primeiro momento uma viagem marítima repleta de famosos, que a partir de suas experiências pessoais e de estudo discutem o panorama político e econômico mundial através da história.
A variação de estilos do diretor passa por momentos desde a absoluta inércia, onde a câmera somente flagra os artistas fazendo a sua arte, como a cantora Patti Smith, bem como analisa, através de cenas bastante alucinadas, as ideias de ditames do filósofo francês Alain Badiou. O conteúdo textual varia entre abordagens documentais e propostas ensaístas. A montagem desses momentos, variando entre o cotidiano de uma viagem de férias com diálogos comuns e rotineiros, e cenas de alto mar, executadas em grande parte com som direto através do forte vento oriental, faz eco com a dificuldade de compreensão da sociedade obcecada por capital, onde é comum que aspectos externos passem por prioridade mesmo diante das mais básicas necessidades afetivas humanas.
Os momentos estruturais diversos se entrelaçam, passando então para terra firme, onde o cineasta acompanha o trabalho jornalístico de repórteres que acompanham o dia a dia da família Martin, que tem nas instalações do posto de gasolina, de onde tiram o seu sustento, também a sua moradia, em mais uma demonstração da amalgama sócio-espiritual dos tempos modernos.
Mesmo na prevalência de momentos em que o discurso é realizado sem falas, não há sentenças vazias, normalmente aventa-se a interpretação do espectador, sem interferência do interlocutor, ainda que silêncio nenhum dentro do drama de Godard tenha em seu intuito o caráter de acaso. A discussão prossegue relacionando a filosofia à incompreensão do homem, mostrando que o abstrato é a tônica principal do roteiro.
A mensagem tenta evocar a vontade popular para determinar os desígnios do povo em mover seu próprio destino, mas sabiamente mostra que a decisão por meio de referendo popular não necessariamente é a saída mais humanitária, tampouco igualitária, pontuada em seus anúncios com uma trilha sonora semelhante a de filmes de terror, usando grande parte do cenário político de países, como Egito e Palestina, para exemplificar o seu ponto.
A poesia do texto final não determina parâmetros de conduta, mas usa seus momentos derradeiros para espezinhar especialmente a tirania ditatorial de direita, utilizando imagens que remetem a questões comuns a todos, como o execrar ao nazismo e o uso de eventos de massa como instrumento de alienação do proletário. As reprimendas também ocorrem diretamente na figura de Franco quando a câmera passa por Barcelona, o que ainda reabre feridas atuais, como a questão da luta por independência da Catalunha. As frases finais, em letreiros de proporções dantescas, há um abismo entre a manutenção das leis e a justiça de fato, uma certeira nota a respeito do cercear de liberdade e do direito do povo.
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