.:: 39ª Mostra Internacional de Cinema em São Paulo ::.
Algumas adaptações de grandes clássicos da literatura e teatro andam provando que o melhor a ser feito é transportar a história e os seus personagens para um contexto contemporâneo do que meramente ambientá-los no período imaginado originalmente. Pegando um comparativo recente, tivemos a deliciosa comédia “Gemma Bovery – A Vida Imita a Arte” fazendo muita mais justiça à imortalidade da obra de Gustave Flaubert do que a roupagem clássica que a cineasta Sophie Barthes conferiu a sua versão estrelada por Mia Wasikowska.
Temos dezenas de versões cinematográficas de “Macbeth”, com a mais recente estrelada por Michael Fassbender e Marion Cotillard e com previsão de lançamento no Brasil para a véspera de ano novo. Para este momento, é a concepção do cineasta Vinicius Coimbra que revitaliza o texto de William Shakespeare. Por um lado, a fidelização ao material não é ignorada, com consequências e diálogos sendo reproduzidos com familiaridade. No outro, “A Floresta que se Move” obtém sucesso ao não manter uma relação de devoção exclusiva a Shakespeare, trazendo boas surpresas narrativas e visuais.
Gabriel Braga Nunes tem um bom momento como Elias, um homem competente com cargo poderoso em um banco cujo dono é Heitor (papel de Nelson Xavier). Um escândalo de desvio de dinheiro, procedido de um suicídio do veterano que o cometeu, faz Heitor selecionar Elias como o vice-presidente da corporação financeira. É justamente a previsão de sucesso feita por uma bordadeira (Juliana Carneiro da Cunha), que substitui as bruxas que ludibriam Macbeth. No entanto, a sua esposa Clara (Ana Paula Arósio, mantendo a excelência e beleza após um hiato de cinco anos) insiste que Heitor deve ambicionar mais, o que acarreta em um crime que irá ruir todo o império construído por este casal.
Um dos aspectos mais fascinantes desta versão moderna de “Macbeth” é o empenho do desenho de produção assinado por Walter Brunialti. A maior parte da encenação se dá em locações no Uruguai, com a casa de vidro de Elias e Clara e os ambientes profissionais estabelecendo alusões com o reino de Macbeth. A sofisticação é também propagada na direção de fotografia de Alexandre Fructuoso e Pablo Baião, que acinzentam as imagens ao ponto de se equiparar com a rusticidade da tragédia shakespeariana.
Ainda trazendo bons achados visuais, como o banho de sangue e as formigas que invadem a sala de Heitor, “A Floresta que se Move” se beneficia com a escolha de Vinicius Coimbra, em parceria com Manuela Dias no roteiro, de compreender o desejo de poder de Elias e Clara na conquista de um império financeiro e ao perturbá-los com ilusões concebidas pelas naturezas corrompidas que carregam. A seriedade com o texto só é comprometida em alguns pontos, como no uso inadequado de bullet time em um momento crucial e o apático desempenho de Rui Ricardo Diaz como o delegado que tumultuará as metas do protagonista.
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